tornar-se "si"


Há muito não me apaixono, o que não é um problema em si, mas acho até curioso pois costumava ser um bobo sentimental. Me entusiasmava fácil, escrevia poemas apaixonados, desenhava, imaginava mil situações não vividas e sofria, sozinho, o que hoje entendo ser apenas um efeito dos afetos infantilizados comuns ao espectro autista. Cheguei ao absurdo de aos 14 anos escrever o nome de uma garota no braço com uma faca, o que felizmente sumiu já que eu cicatrizo fácil. Lembro que uma vez prometi que me casaria com a pessoa que fizesse meu mp3 mental tocar “First Day Of My Life” dos Bright Eyes, foi minha última promessa nesse sentido. E por mais idiota que isso seja, as vezes sinto um pingo de falta dessa inocência, um pouco desse desespero entorpecente, mas depois passa. A vantagem de envelhecer é que o tempo nos faz colocar os afetos em seus devidos lugares e a pena de si próprio dá lugar a uma resignação positiva. Sei meus defeitos, conheço meus medos, sei nomear qualidades e sei o que fazer com isso. Ou algo ou nada. Saber as vezes basta. E é prazeroso quando a solidão se torna uma companheira de cafés, caminhadas e bons livros e não uma punição imposta pela minha própria natureza biológica. Por incrível que pareça eu estou até bem, e mesmo que estivesse mal, já não gostaria de ser nem um pouco diferente do homem que me tornei. Aquele esforço todo não foi jogado fora. No fundo, bem no fundo, o que alcancei foi paz. O mundo desaba e não deixo de passar meu café.


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