um pequeno ensaio otimista acerca do vazio

 


É curioso que o conceito comum de solidão envolve a busca obsessiva por algo ou alguém que preencha o vazio inerente à vida. Um vazio que é inerente não pela falta de propósito, mas sim para que o propósito seja possível. Um ser completo não tem margem a nada, não tem razões para buscar ou se mover. Um ser completo não compreende conceitos humanos basilares como amor, amizade, família, sentido ou prazer. Ele é completo, preenchido, um bloco de concreto. 

 

Geralmente a primeira forma de preencher o vazio é a religião, onde Deus ocupa todo o espaço que deveria ser ocupado pela própria experiência. Mas mesmo Deus, inventado perfeito e completo é insuficiente para domar a carência humana; então surge a necessidade constante de entretenimento, o único capaz de fornecer a distração complacente que atenua o cansaço de ser, mas o entretenimento é temporário e perde o efeito rapidamente, dando lugar ao tédio, inimigo maior dos que temem o próprio buraco no coração; aqui o entretenimento dá lugar a busca pelos sonhos dos outros, digo, pelo que a sociedade e a cultura vendem como garantia de completude, ou seja, o namoro, o casamento, a família. A questão aqui é que Darwin tinha razão, nosso ímpeto de procriar é pura preservação de genes, não existindo um propósito natural e sim as ficções que nos contam aos poucos. Na falta do fim do vazio, a frustração toma conta do casal e a família não parece aquele pomo dourado que te prometiam desde a infância. 

 

Talvez por isso o adulto médio seja tão perdido na medida em que se finge completo. Desesperadamente ele recorre aos mesmos artifícios para aplacar a solidão, mas estes perderam o efeito enquanto este ainda gozava de alguma juventude. Com o corpo cada vez mais decrépito, fica difícil se entreter, se prostrar de joelhos ou procurar outro parceiro com a mesma ferocidade. E agora, diante da morte, surge a última forma de preenchimento, a ilusão e eternidade, de que após o fim da existência existe alguma forma de glória e completude infinitas. Ou seja, o ser humano não aprende nada com a própria existência.

Comentários

Postagens mais visitadas