História de nenhuma importância sobre ninguém relevante

 


Não havia tempo a perder, mas também não havia nada que pudesse ser feito. Era a sina de Jonas, refém de sonhos e circunstâncias. Trabalhava num boteco fedorento e morava num quarto emprestado em um motel falido cuja senhoria era sua amante. Maria, não dizia a idade, mas só tinha metade dos dentes, apesar disso permanecia cheirosa. Jonas não escrevia bem, ainda assim chegou à cidade com vistas de ser um escritor a dez anos atrás. Não aprendeu nada. Havia marcado no braço esquerdo um nome referente a um romance homossexual do seu breve período num quartel, acabou expulso por amar. O amor não combina com igualdade e com uniformes, enfim. Ostentava na parede acima da cama um poster do Jimi Hendrix Experience, estava quase sempre com sua camiseta surrada do Frank Zappa & the Mothers Of Invention, gostava de tomar banho ao som do Pornography dos Cure. Era simples, se contentava com um burrito e sua cerveja favorita no final do expediente. No fim da rua visita um pequeno mercado onde uma moça de um olho só e grandes peitos saltitantes divide com ele os cigarros. Ambos conversam sobre novela, tragédia, amores frustrados e o horror de estar vivo. Seriam filósofos existencialistas? Até pensou em cursar filosofia e ser um desses doutores pedantes vendendo palestras sobre como se tornar mais inteligente, mas faltou tempo e dinheiro - talvez por sorte, já que sua única vocação era não ser nada - dizia. Apesar dos percalços era querido por todas as putas, mendigos, traficantes, enrustidos e loucos que perambulavam depois das 23:30. Quando tinha algo, sempre dividia. De vez em quando se debruçava num livro com uma dose de conhaque do lado, era o único momento em que fingia ser outra coisa. No dia em que não apareceu todos sentiram falta. Não foi ao trabalho, não comeu a senhoria, não foi pedir os cigarros nem cumprimentou os malditos da madrugada. Não se sabe se morreu, se mudou de estado ou de identidade. Ficou o pôster acima da cama, as cartas não respondidas e a falta que sentiam daquele personagem da rotina. Jonas não era nada. O nada tem sua importância.

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