um pequeno diário de quarentena #2



Eu nunca fui bom em iniciar conversas, talvez por isso ficava sozinho. Achava os assuntos enfadonhos, bobos ou descartáveis, mas não sei se por empáfia ou por inadequação. O que sei é que precisei aprender a memorizar e observar, mas só depois de entender que o segredo de uma boa amizade é ter pretextos para uma conversa. Seja música, amor, café, caminhada, bichos, comida, o elo mais forte entre as pessoas geralmente é construído pelas coisas mais banais. Não conheci nenhum amigo desmascarando Hegel e Wittgenstein; não conheci nenhum amor num debate enfadonho sobre a última revisão de um seminário interminável do Jacques Lacan. As pessoas que mais amo encontrei por acaso em redes sociais e brigas em fóruns da internet, o elo comum é que foi sempre banal. Não tenho amigos para debater as coisas que posso aprender e discutir sozinho, não tenho amigos para complementar o que me falta, eu tenho amigos para compartilhar afetos e pequenezas tão mundanas que fazem com que a vida nem precise ter sentido, que não precise ser nada além de um simples momento em que a gente ri um riso infante sobre as aventuras do Vanilla Ice na Maçonaria ou aquele filme ruim que por alguma razão a gente já amou. O mesmo vale para o amor, eu não preciso da angústia de gastar a vida perseguindo um futuro sem que exista presente ou espaço para o acaso. É justamente os gestos que fazemos e as palavras que dizemos despretensiosamente que nos faz preciosos uns aos outros (ou não). Eu prefiro não ignorar esses detalhes.

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