pequena janela para o mundo
Cresci no fim do mundo onde o normal é não saber de nada. Fora a escola, a biblioteca pública e os telejornais, todo o conhecimento chegava na forma de preconceiros, crendices ou simples burrice. Até os 13 anos de idade tomei banho de lata no quintal, então não tínhamos dinheiro para poder ter e o ter acabar permitindo ser. Fui invisível durante a maior parte da vida até que tive um computador.
A internet era naquele momento uma janela para a possibilidade. Fiz amigos com quem falar de temas mais variados que o clipe do Linkin Park ou CPM22 na MTV e quem gostaríamos de ter a chance de beijar numa futura festinha de escola. Foi quando pude ler sobre tudo que tinha interesse e baixar todos os discos que jamais chegariam até mim de outra forma. Aquele momento simples foi definidor de quem sou hoje, então me recuso a aceitar que aquelas horas perdidas online foram desperdício. Sinto até um pouco de nostalgia.
A verdade é que esse mundo virtual durou pouco, logo vieram as grandes redes sociais, os smartphones com seus apps, os algoritmos e toda a premiação da futilidade como jamais vista. Não é que não consumíssemos Britney Spears ou Backstreet Boys, mas ninguém precisava falsificar uma citação do Foucault para fingir que isso era um hábito sofisticado. A verdade é que a internet deixou de ser escape para ser extensão da vida cansativa da qual tentávamos fugir.
Não gosto dessa ideia de perfil profissional, de tirar fotos para obter likes e falsa atenção, de não poder conversar sobre nada sem o tom professoral em que vendem a si mesmos como produtos a serem consumidos. Todos agem e pensam como "criadores de conteúdo" enquanto ninguém cria de fato qualquer coisa que possa ser consumida. É tudo eu, eu, eu, como eu faço, o que comprei oi ganhei, como eu namoro, olha essas marcas que eu gosto mas apesar de tanto eu ninguém é indivíduo, ninguém tem substância ou profindidade em nada. Tornamo-nos todos superfície e eu não sei nadar e subir para cima.
Fiquei velho e obsoleto rápido demais, os anos passam e sigo me afogando por insistir em estar agarrado as mesmas coisas que me fizeram quem sou, nem sempre coeso e apaixonado, mas sempre coerente com minhas idiossincrasias. Um dia tive a chance de olhar pelo que era a janela do mundo e tive a chance de me fazer maior. Hoje o que era janela virou porta e tanto quem está dentro quanto quem está fora vai te vender um curso, uma quinquilharia e uma filiação a uma seita evangélica. Passei anos me sentindo o chato, mas foram os outros que fizeram isso de nós.
Não sei viver sem poder apreciar. Saudade de quando o incômodo era só o uso abusivo de comic sans.
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