quarentena

@kiwisatanico

Hoje percebo que sempre vivi em quarentena. Evitando a tragédia dos afetos em excesso, evitando sons e texturas, tentando ser menos humano. Fui sempre o isolado, deixado de lado primeiro por estranheza dos outros, segundo por opção. É que aprendi a viver só e a gostar da solidão. Perco tempo, devoro livros e músicas, brinco com a cachorra, cozinho minhas simplicidades, escrevo, desenho, enfim, preciso de rotina. Talvez por isso a pandemia não me assombre como aos normais, pois ainda que eu me preocupe com meus amados e sua saúde, a única coisa que me assombra de verdade é a ignorância humana. A burrice, essa anti-razão tão em voga em tempos de trumps, fakes, bolsonaros e falsa justiça social. De resto, sempre fui casa- trabalho, faculdade-casa, escola-casa, quarto-cozinha, não sei se pelo autismo, mas sempre estive presente no meu mundo pessoal, e quase sempre enquanto o mundo morria e eu também. Agora não morro, não existencialmente, biologicamente eu nem sei, mas se sim eu não lamento, se não eu vou continuar procurando o que fazer. Só não me assombro. Ficar em casa não é o fim do mundo, sair lá fora nunca foi só felicidade. Verdade é que a gente mora onde nossa consciência está, aqui dentro, esse universo de ilhas morais. A escrita é o barco.