o eu e um caracol humano


Andando sob um céu estrelado de uma quarta-feira uma brisa quente me rompeu. Lembrei que ano passado uma parte de mim foi morta, e a outra, que cresceu feito tumor preenchendo o espaço vazio ainda não tem nome. O que sei é que já não me sinto capaz de amar as pessoas da mesma forma, de entregar meus afetos numa bandeja e me contentar com abraços frios como o menino inocente que fui. Voltei a afastar estranhos, a disfarçar quem sou com os maiores absurdos que somente eu vejo graça. Mas no fim dessas contas foi bem melhor. Agora já não rastejo, nem sofro quando Andressas e Gabrielas me quebram em pedaços quando digo a verdade, quando falo dos detalhes. Hoje vejo que já tenho família, já tenho afeto e que mesmo a solidão vez ou outra me propicia algo maior, um mergulho dentro de mim a descobrir cada vez mais detalhes sobre quem sou, sobre o que não posso encontrar do lado de fora. No fim das contas essa coisa que cresceu, ainda que feia e torta, que o cheiro seja estranho e as coisas nunca dêem certo, essa coisa é a felicidade. E só é felicidade se for eu, se sair dos meus dedos gordos e desengonçados, do contrário é só promessa vazia de uma sociedade que insiste em nos enfiar em caixas chamadas religião e normalidade. No fim desses dias é como meu eu menino me dizendo após um episódio de desenho animado que esse vazio é meu e eu preencho como eu quiser, com quantas e tantas coisas eu quiser, e quando e se eu quiser. E que só é felicidade se for eu, e só é de verdade se nós também formos eus e não outra coisa, nem promessa e nem dívida. Mergulhar para dentro também é liberdade.

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