a vida que existe entre cada chegada ou partida

People in the Sun, 1963 by Edward Hopper
Uma coisa que não temo é que minhas pessoas queridas decidam sair da minha vida. Que o caminho distante nos desencontre ou que a mágoa, cotidiana, por um motivo bobo, venha a se sobressair sobre o que já construímos de belo. Verdade é que não se controla os desencontros e encontros do futuro, e se controlássemos, cairia por terra a honestidade das relações, e seria ainda mais gritante essa impressão de simulação. Essa impressão de uma ordem plástica e obsoleta onde amor é só um símbolo verbal que pronunciamos quando não sabemos o que dizer. É que afinal de contas, quão honesto seria agir em função de apaziguar ânimos que nunca foram aflorados? Ou de conter rancores ou decepções como se fossem a garantia de se preservar as memórias sobre aqueles dias no bar ou no parque? Os dias lindos acabam no papel, seja em crônica ou poesia, já a vida adulta nos faz carentes de uma nostalgia insaciável.

E o curioso é que ao mesmo tempo em perdemos aquela inocência jovem que me fazia dedicar tardes inteiras ouvindo Rancid e conjecturando sobre as possibilidades de que a garota bonita da turma resolvesse me beijar, ganhamos a sabedoria de reconhecer que as pessoas mudam e que, graças a zeus, muitas delas vão sobreviver a quem você se tornar. E apesar de que ela nunca beijou, e eu nunca beijei as mais de mil bocas que me chamam a curiosidade; beijei algumas outras bocas, contei algumas muitas mentiras, broxei em algumas camas e em outras até me senti herói, mesmo que de uma jornada efêmera e bêbada por alguma diversão.

O fato é que agora, mais que na adolescência, o amor das pessoas que tenho me é tão ou mais importante que o ar que respiro, metaforicamente, pois são nossas lembranças que não me deixam sozinho quando a insônia vem assombrar meu quarto. Porém, agora que reina o bom senso e não a expectativa, a companhia carece da honestidade de sermos quem somos, e não há muito de honesto no ato de se sacrificar por uma lembrança, que se for positiva, se manterá por si só, sem esse esforço de uma vida. Ainda que aquele rosto desapareça da sua timeline da vida real.

Outro fato é que eu sinto muito se o hábito de discordar te magoa, ou se a dureza com que encaro o mundo te deixa inseguro, mas não existe outro eu, outra forma de ser quem sou ou uma maneira mais segura de saber que se ama do que permitindo que as pessoas sejam o básico, justamente quem são. Ainda que no fim descubramos que nunca gostamos nem um pouco disso. Dessa vida que só acontece enquanto o mundo é real. E que não há outro lugar em que possa acontecer.

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